A relevância das traduções para a constituição de uma “República Mundial das Letras”, como diz Pascale Casanova em seu livro do mesmo título, depende de uma diversidade de fatores. Desde o valor ou peso relativo de cada idioma no sistema internacional, não apenas literário, até da quantidade e da qualidade das traduções.
Esses intercâmbios culturais podem incluir também elementos de projeção de poder nacional (o famoso soft power) e outras medidas. Mas, em termos de solidez e importância para a compreensão de cada país, as traduções literárias assumem um papel de extrema importância.
Os professores Jefferson Mello (USP) e Sébastien Rozeaux, da Université de Toulouse, lançaram convocação para um número da revista Les Cahiers du FRAMESPA, para trabalhos relacionados ao tema “Brasil literário” no exterior – Perspectivas transnacionais (de 1822 aos nossos dias). A FRAMESPA – France, Amériques, Espagne – Societés, Pouvoirs, Auteurs é a publicação de um laboratório conjunto da Université Toulouse-Jean Jaurès com o CNRS, o equivalente ao CNPq brasileiro. O “Cahiers” é uma revista de história social que se propõe a analisa-la, em suas dinâmicas, desde a Idade Média até hoje, privilegiando as aproximações e aberturas para outras ciências humanas e sociais.
As propostas de produção de trabalhos para a publicação terão no máximo 500 palavras, acompanhadas por uma breve apresentação biobibliográfica, e devem ser enviadas até dia 10 de dezembro de 2018, usando estes dois endereços: sebastien.rozeaux@univ-tlse2.fr e jefferson@usp.br.
O professor Jefferson Mello começou a se interessar pela questão ao preparar sua tese sobre a difusão da obra de Bernardo Carvalho na França. O professor Roseaux pesquisou sobre a fragilidade de um espaço literário transatlântico (Portugal-Brasil-Países africanos de língua portuguesa), a partir de como é tratada a literatura brasileira no “Dicionário bibliográfico português” de Inocêncio Francisco da Silva, a monumental obra que continua sendo atualizada e hoje já tem mais de 25 volumes publicados.
Jefferson Mello lembra que já existe uma bibliografia relativamente grande sobre o assunto. O tema, aliás, é suscitado desde o famoso ensaio de Machado de Assis, “O Instinto de Nacionalidade”. O professor argumenta que, apesar do crescimento recente das influências culturais dos EUA, a cultura europeia, particularmente a francesa, foi decisiva na formação dos conceitos de nacionalidade, “em nome de um ideário de civilização que assumiu sua estreita filiação com a Europa”.
As trocas culturais são objeto constante de pesquisas em ciências sociais e política, e o tema, quando aponta especificamente para a Literatura, objeto de grande interesse para a Literatura Comparada.
O chamamento, portanto, permite a apresentação de trabalhos com escopo bem amplo. Inclui desde as modalidades de recepção das diferentes correntes literárias, até o papel das instituições culturais e ações políticas (específicas ou como manifestação de soft-power), passando por análises sobre a trajetória dos mediadores culturais dessa relação. Lembra ele que esse papel foi exercido por historiadores e ensaístas, como Varnhagen, Joaquim Nabuco e Gilberto Freyre, e também por escritores que alcançam repercussão e consagração internacional, como Mário de Andrade, Guimarães Rosa, Jorge Amado e Clarice Lispector. Inclui-se nessa perspectiva, também, eventuais estudos sobre autores das novas gerações brasileiras, inclusive na perspectiva comparada.
Jefferson Mello teve cursos na EHESS – École des Hautes Études em Sciences Sociales, e as perspectivas teóricas das análises de Pierre Bourdieu e de Pascale Casanova orientaram suas abordagens na tese sobre a difusão de Bernardo Carvalho.
A conjunção de esforços entre professores de Literatura e História permite uma visão dinâmica e temporal de um processo de certa forma parecido com o Mapeamento da Literatura Brasileira do IC. A perspectiva do Mapeamento volta-se essencialmente para as relações e o dinamismo que estabelece com um número bem definido de agentes. A publicação pretendida pretende outro tipo de abordagem. “Já se constatou, por exemplo, que escritores das antigas colônias – Angola, Moçambique, Cabo Verde – tinham e tiveram uma relação de admiração e incorporação de padrões literários que os aproximava muito mais do Brasil que de Portugal. Essa é uma triangulação importante para ser estudada”.
Os artigos selecionados (durante o mês de dezembro) deverão estar prontos para o dia 26 de abril de 2019. Deverão ainda estar de acordo com as normas da revista, disponíveis no site.
por Felipe Lindoso
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